terça-feira, 23 de setembro de 2008

Intolerância religiosa

Ainda influênciado pela marcha contra intolerância religiosa, resolvi reproduzir trechos de um texto do padre Clóvis Cabral, publicado revista história viva.



O Diálogo fundamental


Muitos são os pontos que uniram historicamente o catolicismo com as religiões afro-brasileiras. Para nós, sacerdotes, religiosos e militantes da pastoral afro-brasileira, travarmos um diálogo com essas religiões é fundamental, já que elas são fruto da experiência da negritude. E o ponto de contato entre a Bíblia e a negritude é a postura permanentemente rebelde dos homens e mulheres do povo de Deus , do povo da Bíblia. A mesma rebeldia estampada nos grafites dos muros das nossas cidades-favelas, gritada poeticamente pelos cantores de rap e entoada em forma de malembe pelas Ialorixás, denunciando todas as formas de intolerância religiosa que, demonizando as religiôes de matrizes africanas, enfraquece o processo de empoderamento das comunidades negras e populares.(...)

O Pontifício Conselho para o diálogo Inter-religioso e a Congregação para Evangelização dos povos publicaram, na Festa de Pentecostes de 1991, um Documento do Magistério Oficial da Igreja Católica intitulado Diálogo e Anúncio ( DA). Esse documento tem por objetivo, desenvolver de maneira mais aprofundada o ensinamento da encíclica " A missão do Redentor"(RM), sobre a relação entre o diálogo inter-religioso e o anúncio do Evangelho. nesse documento, o Diálogo Inter-religioso é definido como " o conjunto das relações inter-religiosas, positivas e construtivas, com pessoas e comunidades de outros credos para um conhecimento mútuo e um recíproco enriquecimento, na obediência à verdade e no respeito à liberdade"


O documento parte de um princípio pedagógico: nós católicos "devemos nos aproximar sensivelmente de outras tradições religiosas, porque elas encerram valores espirituais e humanos (e por isso) exigem respeito da nossa parte"


O diálogo requer uma atitude equilibrada de ambas as partes. Não devemos ser demasiadamente ingênuos nem hipercríticos, mas abertos e acolhedores. Há que ter vontade de se empenhar em conjunto, a serviço da verdade, e ter a prontidão de se deixar transformar pelo encontro. Isto não significa que ao entrar em diálogo coloquemos de lado nossas próprias convicções religiosas. Longe de nos enfraquecer a fé, o diálogo verdadeiro a torna mais profunda. Para dialogar, é preciso ter muita paciência. As pessoas se pertencem. A exclusão do " outro", simplesmente porque o outro é diferente, é um pecado para os católicos. Nas comunidades-terreiros, o primeiro princípio mais apreciado da vida em comum é o de incluir e não excluir. O ser humano não é só força vital (axé), é muito mais que isso, é força vital em participação.


Neste século, as comunidades de origem negra, todas elas ( terreiro de candomblé, batuques, xangô....)têm desempenahdo esta visão de cidadania, justamente por isto, são atacadas violentamente. De fato, as religiôes afro-brasileiras e suas comunidades religiosas têm sido, ao longo da nossa história, as vítimas preferenciais da intolerância religiosa. Quem as persegue, quem as ataca, quem as sataniza, quem as desqualifica, sabe exatamente o que esta fazendo. Sabe que as destruindo, destrói o coração de um modo de viver. Sabe que elas são as guardiãs da cosmovisão afro-brasileira, espaços vitais que, ao longo dos séculos, têm a possibilitado a sobrevivência com dignidade das populações negras deste país. (...)
pe. Clovis Cabral é teólogo e educador popular

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