domingo, 8 de julho de 2007

Comércio Ambulante e o espaço



Nas últimas décadas, assistimos o desenvolvimento da técnica e da ciência, em velocidade nunca antes vista. Essa reformulação, cada vez mais acelerada das técnicas e da ciência, ocasiona redefinições nas relações do homem com o espaço, com a economia e com o próprio homem. As transformações/modernizações hoje atingem a todos os setores da sociedade, de uma forma diferencial, devido ao seu caráter seletivo; mas apesar da diferenciação interna existente entre os locais/setores/regiões, atingidos, todos indiscriminadamente sofrem mudanças impostas pelas novas formas de produção/comércio/consumo, mesmo que não absorvam somente benefícios dessas mudanças.

O mercado de trabalho, certamente, sofreu diretamente os efeitos da modernização (tecnológica, social e econômica). Na década de 80, o número de desempregados aumentou tanto pela expulsão da PEA (população economicamente ativa) já inserida no mercado de trabalho, como também pela não absorção desta população recém chegada ao mercado; isso é fruto direto da crise econômica, e da tentativa de superá-la através da adoção de novas técnicas, novas políticas econômicas e sociais. Entretanto, a adoção destas novas práticas têm por base ideológica e política o neoliberalismo, tendo este um “caráter revisionista em relação às conquistas sociais obtidas pelos trabalhadores ao longo das três últimas revoluções industriais” (Cano,1994).

No Brasil, um país semi-periférico[1], a crise do emprego se manifesta de uma forma mais explícita, já que as demandas sociais nunca foram amplamente atingidas; sendo assim, cria-se mais facilmente e marcadamente divisões em relação ao consumo e à inserção no mercado de trabalho. Temos assim dois grupos: os integrados ao consumo “moderno” de uma forma ampla e o grupo que encontra-se à margem da sociedade “moderna” de consumo, obtendo e sobrevivendo com os restos, e/ou buscando novas formas de integração a um modelo de consumo.

A questão do trabalho, se agrava nos grandes centros urbanos industriais, onde se concentra a maior parte da população brasileira. Mesmo porque, na cidade os novos modelos de gestão são mais facilmente absorvidos, já que se trata do centro de controle da reprodução da sociedade capitalista em termos de força de trabalho, troca e padrões de consumo.

Os dois principais centros urbano-industriais brasileiros, Rio de Janeiro e São Paulo, apresentam mais nitidamente sintoma da chamada crise urbana: violência, inchaço, ocupação desordenada, favelização/periferização e desemprego. Esses sintomas não são recentes, porém a atual conjuntura das relações de produção marca um caminho, no qual esses problemas tendem a se agravar. Com a mesma velocidade com que as práticas modernas e flexíveis de produção, acumulação e consumo, são absorvidas pela cidade, criam-se setores excluídos, segregados e/ou parcialmente absorvidos. Dentre esses “sintomas” o desemprego assume um caráter principal e peculiar, já que a oferta de emprego não suporta a demanda populacional ( mesmo que o ritmo de crescimento tenha sofrido uma redução) .


A segregação espacial que se dá no processo de urbanização capitalista, além de distanciar o espaço de moradia do espaço de trabalho, atua primeiro através de práticas sociais que impõem maior ou menor possibilidade de acesso aos meios de consumo.

Portanto, de que forma essa população urbana, excluída dos padrões de consumo moderno, busca se integrar e sobreviver? O espaço é seletivo tanto espacialmente como socialmente, será então que essa população excluída socialmente deve se apropriar do espaço, o qual também lhe é negado, para que assim busque uma forma de integração social?

Com a mesma velocidade com que a cidade se integra, ela se fragmenta excluindo uma das partes, portanto, não é estranho compreender o aumento, nos últimos quinze anos, da parcela da população economicamente ativa na economia informal, e do processo de hipertrofia do setor terciário, sendo essa uma característica do processo urbanização periférica. Assistimos então um acréscimo no número de vendedores ambulantes (camelôs, marreteiros, etc.), que buscam através desta atividade sobreviver e atingir melhores padrões de consumo, que o possibilitem se reproduzir como trabalhadores.


Esse grupo socialmente excluído, ao buscar sua inserção econômica através da economia informal, no caso, o comércio ambulante, imprime no espaço sua marca seja pela favela, seja pelos ambulantes que ocupam os logradouros das grandes cidades, produzindo uma nova feição urbana, acrescentando novas características ao contexto urbano. A produção desse espaço é antes de mais nada uma forma, uma expressão, de resistência e ao mesmo tempo uma estratégia de sobrevivência ao contexto urbano1 que não lhe é favorável.


Um inenarrável Abraço


1 GOLDFARB, E. (1993) entende-se por contexto urbano, como sendo um conjunto de circunstâncias físicas e sociais que interferem num uso, ou seja, as ruas, as praças, os prédios, os seres humanos, não existem como elemento isolados, mas sim, como fatores de um conjunto, sendo a cidade resultante da inter-relação ativa desses fatores.

Um comentário:

Diego Moreira disse...

Lembrou o mestre Milton Santos que afirmava que as benesses da cidade não estão ao dispor do desfrute de todos de forma igualitária.
Excelente texto!!!
Abraço!

 
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